em Liberdade, Universidade

A história nos ensina que quando uma Universidade não soube adaptar sua missão às necessidades culturais e sociais de seu tempo, acabou por ficar isolada. A fidelidade à sua razão de ser exige da instituição universitária uma contínua renovação, para continuar iluminando e servindo a sociedade através das mudanças dos tempos e dos lugares. Mais ainda: é a Universidade que deve estar na própria origem dessas mudanças. A fidelidade aos seus princípios constitutivos e à sua identidade como instituição superior implica em um espírito de vivificação contínua, mesmo em circunstâncias adversas.

Ora, um dos grandes princípios que identificam a Universidade é a unidade dos saberes que ela cultiva. Manter e fazer resplandecer essa unidade é uma tarefa vital, e que nunca irá terminar. É uma meta cujo cumprimento constitui a própria vida da Universidade. Seu objetivo contínuo sempre será recompor sua Unidade de Pesquisa, de Ensino e de Extensão, dentro e através da mutabilidade dos contextos sociais. Para isso a Universidade exige de si mesma uma contínua renovação.

Contrariamente ao que uma leitura superficial poderia imaginar, inovação e fidelidade aos princípios não são atitudes antagônicas. A liberdade não se reduz à aplicação de um esquema abstrato e estereotipado. A fidelidade à missão recebida requer imaginação, espontaneidade, iniciativa, agilidade de decisão, juventude interior. Não há receitas nem formulários para enfrentar as conjunturas, que sempre serão inéditas.

Se isso é válido para qualquer âmbito da vida, é de especial vigência no âmbito universitário: a Universidade tem uma relação essencial com essas realidades que recebem o qualificativo de “novas”. A história intelectual do Ocidente nos ensina que quando as universidades se esqueceram que a inovação é seu sinal de identidade mais característico, elas imediatamente caíram em um academicismo rançoso, em uma prepotência orgulhosa e oca, que as esvaziou de conteúdo e obscureceu sua missão. Pelo contrário, quando souberam estar “na própria origem das mudanças corretas que surgem na vida da sociedade”, – para usar a expressão de S. Josemaria Escrivá, fundador da Universidade de Navarra – então ficaram na vanguarda da história, estiveram no próprio nascimento do conhecimento novo, e ganharam a liderança que lhes corresponde, no terreno do saber publicamente reconhecido.

O amor pela tradição – outra característica vital da universidade – não é de forma alguma incompatível com o desejo do progresso. Uma tradição que não se renova mostraria claramente que está morta, e seria então uma carga balofa e incômoda, que se arrasta sem motivo. Por outro lado, não existe progresso verdadeiro que não brote de uma história pujante, que sempre floresce em rebentos novos, prova de sua vitalidade e de sua força.

Mas vamos nos entender bem: a relevância da tradição só é viável se a conseguirmos libertar de seu cárcere tradicionalista. Porque existe um tradicionalismo conservador que é apenas o erro oposto do progressismo liberal: ambas as linhas de pensamento estão contaminadas pela visão obstinadamente unilateral e “caolha” do homem e da história humana. A genuína ideia de tradição está arraigada na complexa e plural realidade dos caminhos que levam os homens a se aperfeiçoarem a si mesmos, ao mesmo tempo que aperfeiçoam as obras de suas mentes e de suas mãos. A lealdade à própria identidade não se deve confundir com um conservadorismo teimoso, incapaz de distinguir entre a seiva fluida e a casca ressecada. Apegarse ao detalhe acidental simplesmente porque “antes se fez assim” mostra que a fidelidade à missão institucional começa a se esvaziar, e vai sendo substituída pelo ritualismo oco e vazio. A tradição autêntica é capaz de evoluir de forma homogênea e renovar-se para dar espaço ao seu próprio desenvolvimento interno, e às cambiantes vicissitudes do entorno cultural e social; enquanto que a falsa tradição é a que se imobiliza em uma espécie de corte temporal, mitificando um presente qualquer, chamado – como todos os outros – a ser absorvido pelo passado.

Considerações a partir de: PEREZ, Rafael: Desfragmentar a Universidade: o Core Curriculum como marco integrados de Saberes. (Comunicação na Universidade de Los Andes, outubro de 2014, e Universidade de Navarra, janeiro de 2018) e LLANO, Alejandro: A Universidade diante do novo. Aula inaugural do ano acadêmico 2002-2003, da Universidade de Navarra.

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